Pequenas empresas iniciam processo de preparação de herdeiros para gestão
Cris Olivette
Criar um processo sucessório em empresa familiar garante que a transição ocorra sem sobressaltos e desavenças. “Esse processo é feito a médio e longo prazo e assegura a continuidade do negócio, pois garante que o comando será dado à pessoa mais preparada, após aval do conselho de administração”, afirma o especialista no assunto, o consultor Juarez Leão.
No laboratório farmacêutico Blanver, fundado por Giuseppe Frangioni em 1984, a preparação da terceira geração começou em 2009 e segue até hoje. Genro do fundador e membro do conselho de família, Ronaldo Lorenzo e seus dois cunhados sempre trabalharam na empresa, o que garantiu que a sucessão para a segunda geração ocorresse de forma natural.
“Em 2009, iniciamos a profissionalização da empresa, que incluiu a implantação de governança corporativa, criação de conselho de administração e conselho de família”, conta.
Em 2014, com a governança consolidada, ele foi incumbido de aproximar a terceira geração do negócio. “São sete netos que, na época, estavam na faixa de 11 a 24 anos. Como tutor, tenho de prepará-los para atuarem como executivos ou conselheiros no futuro, pois serão sócios sucessores.”
Por meio de reuniões que ocorrem a cada quatro meses, os herdeiros tomam conhecimento da história do fundador, da criação da empresa, das pesquisas de novos medicamentos e do planejamento estratégico.
Lorenzo afirma que no início foi difícil prender a atenção dos mais jovens. “Para mantê-los unidos, participativos e quebrar o ritmo das apresentações, passamos a incluir atividades físicas de integração e os resultados foram bons.”
Hoje, três herdeiros já são formados em publicidade e marketing, arquitetura e administração e atuam no mercado de trabalho, após terem estagiado na Blanver. “Ter experiência profissional fora da empresa é uma das regras do processo de sucessão.”
Informação
Para entender as etapas desse processo, os fundadores da rede Casa do Construtor, Altino Cristofoletti e Expedito Arena, buscaram formação e informação, a partir de 2010, quando a rede chegou a 100 unidades. Hoje, são 250 pontos. “Percebemos que o negócio tinha crescido e que era preciso estruturar a empresa que erguemos do zero, a partir de 1993”, afirma Arena.
O marco na história da Casa do Construtor ocorreu em 2011, quando os sócios foram eleitos empreendedores Endeavor (organização que seleciona empresas de alto rendimento para receberem capacitação e mentoria). “Tivemos mais de 200 encontros com mentores e contratamos uma consultoria que nos auxiliou a implantar o processo de governança.”
Os herdeiros de Arena são mais velhos que os filhos de Cristofoletti. Bruno e Mariana, hoje com 36 e 32 anos, respectivamente, atuam na empresa desde os 14 anos. “Digo que eles são cofundadores, pois começaram fazendo serviços bancários e cresceram com o negócio. Hoje, Mariana cuida da gestão das lojas próprias e Bruno coordena o serviço de apoio ao franqueado.”
Já os filhos de Cristofoletti, duas meninas e um menino, são mais novos. “As filhas já são formadas, uma atua com moda e designer, a outra estudou economia e está estagiando em uma de nossas lojas. O filho ainda cursa o ensino médio.”
Para criar o próprio modelo de sucessão, os sócios e os filhos de Arena fizeram, ao longo de três anos, vários cursos como o de conselheiro oferecido pelo Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) e passaram por mentoria sobre famílias empreendedoras. “Isso nos ajudou a consolidar o processo. Montamos um conselho de administração consultivo com conselheiros especializados em franchising, varejo e mercado.”
O próximo passo é definir o processo de transição para passar a gestão a um CEO, que será responsável por formar o sucessor, seja da família ou não. “Bruno e Mariana podem ser sucessores? Achamos que sim, mas ainda são novos, apesar de terem conhecimento e qualificação. Isso será definido no futuro, pelo conselho de administração.”
De acordo com Arena, sucessão não é tarefa fácil para os fundadores. “Estamos fazendo sessões de coach para nos prepararmos para o momento de transição. É difícil ‘largar o osso’. Nosso sonho era termos uma empresa regional, que depois passou a ser estadual, nacional e agora é internacional, com uma unidade no Paraguai. A cada objetivo alcançado o sonho se alarga”, diz o empresário.
Banca. A morte prematura do fundador do escritório Urbano Vitalino Advogados, impactou a banca. Com a saída dos sócios, Urbano Vitalino Neto acabou ficando a frente do negócio e trouxe novos parceiros para o empreendimento.
O advogado lembra que, quando o fato ocorreu, 15 anos atrás, eram 20 pessoas trabalhando na empresa. “Iniciei processo de profissionalização e hoje temos 650 pessoas distribuídas por unidades em todo o Brasil”, conta. “Eu já estava à frente da gestão do escritório, com viés mais administrativo”, lembra.
Pai de cinco filhos, o mais velho com 16 anos, Vitalino Neto diz que, pela lei brasileira, só pode assumir uma empresa de advocacia quem é advogado.
“Então, preciso aguardar para ver se alguns deles vão querer seguir esse caminho, para só então iniciar o processo sucessório. Alguns já demonstram interesse, mas ainda é cedo para decidirem”, diz.
De acordo com ele, o planejamento sucessório precisa ser enfrentado e é algo muito delicado, especialmente para os mais velhos, porque indica que a pessoa está se preparando para o fim da atuação profissional.
“No entanto, para o bem da família, das relações familiares e para a continuidade da empresa, é um passo necessário. Juntos, os familiares devem definir as regras para a sucessão, que sempre devem seguir critério meritocrático. É bom que isso ocorra enquanto os pais estão vivos e podem ir ajustando os anseios dos herdeiros.”
Texto: CRIS OLIVETTE
Fonte: https://economia.estadao.com.br/